"Uma Imagem por um Texto"
Pensar em nada,
absolutamente nada, por um pequeno momento que seja, tão-só frações de segundo
e deixo-me assim deslumbrar pela aparatosa explosão das ondas, numa dança viva
da maré, com o branco da espuma a evidenciar-se e a atingir a areia numa
perfeita sinfonia, colorida pelo profundo azul do mar e dos céus a revestirem
todo um horizonte.
Encandeado por um
resplandecente sol de abril inesperadamente adverso, viro-me para o mar como
que a contemplar o mais belo dos espetáculos e meto as mãos nos bolsos, por
forma a encurtar o ar gélido que se faz sentir, apenas eu, o meu sol, o meu
mar, a minha praia, no emotivo silêncio dos meus pensamentos.
Solto a mente das amarras
a que estava adstrita e deixo-a deambular.
Pergunto-me quantas vezes
terei eu já estado naquele mesmo local, fosse a expurgar males da alma,
libertar fantasmas, deixar partir entes queridos ou mesmo tão-só a alimentar o
mais profundo do meu ser, sabendo não ter a resposta, nem sequer em números
meramente aproximados.
E aqui estou eu, uma vez
mais, com um sorriso e hipnotizado perante tanta beleza. Olho de relance para
trás, enquanto me presto para tirar sapatos e meias, para ter o sentir da areia
nos pés.
O tempo parece querer
parar e vejo-te, a desfilar em câmara lenta na minha direção, de olhar
brilhante e cabelo quase tão esvoaçante quanto o teu vestido curto. Bela como a
vida, lanças-me um sorriso e, quase em ritmo de dança, livras-te dos sapatos
para começar a correr. Dou um passo atrás na tua direção, devolvo um sorriso
preocupado e tiro o casaco de malha.
- Não tens frio?
Aproximas-te e, sem
responder, atinges-me com um sorriso atrevido. Sigo no encalço do teu beijo,
ignoras-me com um piscar de olhos e continuas a desafiar-me com o cair do
vestido, avançando insensatamente na direção do mar.
Dou um salto na tentativa
de sabotar tamanha loucura, mas pareces deslocar-te a uma velocidade superior.
Sinto um pulsar mais
rápido e o arfar da respiração.
Entro mar adentro, mas não
te vejo, luto contra vagas e corrente, até que consigo chegar a ti. Agarro-te
com toda a minha força e desesperadamente grito qualquer coisa como:
- És uma grande maluca.
Já em terra, aperto-te
junto a mim e dou-te um beijo sentido.
Abro os olhos num
despertar contra os teus lábios, seguido de um:
- Não voltas a fazer-me
isto.
Ao que, num misto entre o
divertida e o surpreendida, respondes:
- Mas, isto, o quê?
Deitado no sofá, vejo-te a
apanhar o meu livro do chão, com aquele sorriso e olhar que me encantam.
Tratou-se de um exercício
de escrita ao abrigo da rubrica “Uma imagem por um texto”, já publicado
anteriormente no “Copo Meio Cheio” em 7 de abril de 2020, sendo que, a imagem
foi generosamente enviada pela Elvira Carvalho, do blogue Sexta-Feira.
Dado tratar-se de uma
reposição, este texto não estará aberto a comentários, servindo tão só de
exemplo para o desafio que penso vos lançar amanhã (sorrisos).