“Quando a vida não te pertence – Os traficantes, Parte II” (Texto 31 de 35)

Com pouco mais de 4 horas dormidas nas últimas setenta e duas, mal alimentado e já com muitos quilómetros feitos, a tolerância de Duarte ao álcool acabou por mantê-lo pela segunda imperial.

O bar permanecia vazio e os poucos clientes que por lá circularam já tinham regressado às suas vidas, com o dono do estabelecimento à espera de se livrar daqueles dois, que nem despesa estavam a fazer, para encerrar e ir para casa.

A partir das onze e meia da noite, Diana Krall passou revisão a uma boa parte do seu extenso reportório.

- E onde é que ele guarda o dinheiro das vossas atividades?

- Era-lhe transferido para uma conta num paraíso fiscal, sem sequer entrar no país. Dizia-me que estava a preparar o salto daqui para fora, que esta vida não lhe servia. Fosse isso quando fosse.

- E em dinheiro?

- Nada em dinheiro. Sei que ele arranjou quem lhe fizesse um novo passaporte, com uma nova identidade, que terá conseguido pagar com dinheiro próprio. A mim disse-me que a conta não era para movimentar até conseguir sair de Portugal. Não sei…

- E onde é que estavas à hora em que ele caiu?

Jaime mostrou-se ofendido e mudou o registo.

- Vai-te foder.

- Não te estou a acusar de nada, mas é uma questão de tempo até que tenhas que dar esta resposta a alguém.

- Estava a dar treinos a iniciados, junto à minha cabana, em plena areia.

O dono do estabelecimento aproxima-se da mesa onde se encontravam, com duas imperiais que não foram pedidas, cortesia da casa, uma forma de suborno para conseguir ir para casa e não desagradar a clientela.

- Tens alguma ideia quem possa ter sido?

- Sei lá, a família dele é estranha, mas ainda assim. A patroa? Aquela gaja está metida nuns negócios bastante obscuros, não é o segredo mais bem guardado.

- Estava com o marido e os filhos de fim de semana em Madrid.

- Conveniente. Agora diz-me tu, como é que ela mantém um tipo com os conhecimentos do Rodrigo apenas com o salário mínimo?

- Isso não significa que esteja envolvida em negócios ilícitos, apenas e tão-só pode estar a fugir aos impostos, aliás, como uma boa parte dos empresários. Viste alguma fatura ter sido emitida desde que aqui chegámos, ele abriu sequer a caixa registadora? Tu emites fatura de tudo o que recebes?

Perante o silêncio de Jaime, Duarte encolhe os ombros, termina com um “Foi o que pensei”, agradece a Jaime por ter-se encontrado com ele e dirige-se ao bar para pagar a conta, sem saber se devia ir para casa dormir ou acordar o amigo e chamar a PJ.

Comentários

  1. Adensa-se o mistério nesta narrativa que estou a gostar muito de ler.
    Muita saúde.
    Um beijo.

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  2. Já nem me ponho a adivinhar, és demasiado bom a esconder o que não queres que saibamos ahahahah, como diria meu pai "boa malha" este é sem dúvida o teu caminho de escrita, digo eu cus berbus, mas que gosto para lá de muito, lá isso gosto :)

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    1. O próximo conto (que ainda está a ser escrito) vai ser diferente e mais ligeiro (e bem mais curto) e vai ser complementado com as frases e imagens fornecidas e é provável que depois disso cheguem as férias.

      Mas, muito obrigado pela tua opinião. Curiosamente é um tipo de escrita que gosto, mas que ao mesmo tempo não tem sido o meu tipo de leitura (li um único livro de Daniel Silva) o que talvez seja limitativo na construção de um conto deste género.
      Um beijinho para ti

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  3. Está complicado!!! Nem sei o que diga. Houve velório, ,...com muita gente lá, mas....há tanta maneira de enganar os outros!!! Vou esperar...é melhor!!! Beijinhos e...até ao próximo capítulo
    Emilia

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    1. (sorrisos) A Emília começa a acreditar que Rodrigo esteja vivo...

      Um beijinho e bom fim de semana

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  4. Isto começa a parecer um crime no expresso do oriente.
    Um montão de mãos a empurrar.

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  5. Interessante diálogo entre Jaime e Duarte, o incansável detetive. Que "coisa" embrulhada! O mistério adensa-se. Já falta pouco para sabermos.
    Tanto que o Rodrigo me desiludiu, como personagem, obviamente.
    Um dia bem bonito e com solinho.

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    1. Eu não sei se desse lado também andam a sentir dificuldades com o blogger, mas há vezes que sinto que respondo ao mesmo comentário mais do que uma vez (para mim já tinha respondido ao da Céu...

      Mas era o que queria... a componente desilusão para com Rodrigo e nesse ponto sinto que talvez tenha sido o personagem que mais tempo de antena teve e que mais acabaram por ficar a conhecer (e nesse ponto já não sei bem se era o que pretendia dado ter querido, na minha mente, dar até mais protagonismo a Duarte o que não sinto ter conseguido...)
      Têm estado dias tão bonitos, é fácil a inspiração navegar... saudades suas, espero que já tenha regressado de férias, um beijo e bom fim de semana

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  6. Cada vez mais intrincada esta história. Desculpe a ausência, mas a saúde está a dar-me mais problemas a cada dia. Conseguiu resolver o problema dos comentários?
    Abraço e saúde

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    1. Consegui resolver o problema dos comentários sem ter de fazer nada… obrigado. Espero que esteja bem, eu é que tenho que desculpar-me pela ausência, mas nem sempre somos donos do nosso tempo ou da nossa energia (sorrisos) o que me faz perguntar se até aqui acham que o título do conto se mostrou adequado…
      Abraço, saúde e muita inspiração

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  7. Conversa entre Duarte e Jaime que vem lançar mais alguma luz sobre a trama.
    A grande incógnita para mim é: quem será o protagonista da história?
    Abraço
    Olinda

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    1. Este foi o meu exercício de escrita mais longo e entre este e o blogue passado há vários que acabei por gostar do resultado final, mas sempre com muitos pontos de melhoria (tal como este acaba também por ter e tento tomar notas para o futuro).
      Ainda assim, foi de facto muito divertido para mim e estou muito honrado com a vossa presença (os resistentes) para mais porque gosto muito dos vossos blogues e é sempre um prazer ler o que apresentam.
      Abraço e inspiração da boa

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  8. Muito interessante a conversa do Jaime com o Duarte, pois começamos a ver o lado oculto da vida do Rodrigo.
    Beijinhos

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