Desafio 4 — “Duas camadas”
Escreve um texto com 130–170 palavras em que existam duas camadas simultâneas:
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o que a personagem pensa/diz a si própria (superfície);
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o que a personagem realmente sente (subtexto), nunca nomeado.
Regras
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1.ª pessoa (para maximizar fricção entre discurso interno e corpo).
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Proibido nomear a emoção real (ex.: “medo”, “ciúme”, “culpa”…).
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Inclui pelo menos um gesto físico involuntário que contrarie o que é dito/pensado.
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Inclui um objeto-âncora (ex.: copo partido, botão desapertado, mensagem lida) que revele a segunda camada.
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Evita explicações psicológicas; deixa o corpo, o tempo e o espaço falarem.
“Solto uns arrastados bons dias. Sento-me
ao computador entre acenos e sorrisos, ancorado pela segurança da cadeira.
Mordo o lábio por puro reflexo, sem sentir a tremura na voz. Silencio o meu
pulsar. Ao café, digo uma ou outra piada. A chávena separa-se do pires e estilhaça-se.
O som seco interrompe o silêncio. Gracejo com a minha destreza, ou falta
dela... Uma colega desfaz-se em ruidosas gargalhadas. Outra chama-me
tonto. Ninguém entendeu. Escondo o olhar. A perna tem vida própria. O chão
quase que cede. A visão turva. Um nó na garganta. Regresso à secretária. No
caminho sinto o enraizar do corpo. Lá fora, a varanda aberta atira-me a escuridão.
O vento arrepia-me. Ao almoço, entre assuntos menos sérios, falou-se de tudo um
pouco. Cuspo palavras apenas para as ver evaporar. Segunda
chávena partida do dia. Um rasgo superficial na mão. Deito um sorriso que morre
ao nascer. Baixo o olhar. Nos cacos, só me vejo a mim.”
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