Desafio 5 — “A Carta Que Não Enviei”
Escreve uma carta a alguém (real ou fictício), mas uma carta que nunca chegaste a enviar — por medo, vergonha, amor, orgulho ou qualquer outra razão.
Pode ser:
· a alguém do passado;
· a alguém do presente;
· a ti próprio;
· a um lugar;
· a uma fase da tua vida;
· ou até a algo abstrato.
O objetivo é
trabalhar:
· introspeção profunda,
· subtexto emocional,
· voz íntima,
· e a tensão entre o que se diz e o que se esconde.
Limite: 400 palavras.
Tom livre: realista, poético, metafórico ou híbrido.
Ainda se escrevem cartas? Imagino o teu revirar de olhos.
A deitar a carta na lareira ou no caixote
do lixo mais próximo, sem abrir. Palavras ficaram por dizer. Minhas e tuas.
Vejo o teu ar de enfado. E, ainda assim, não sei bem por onde começar. Consigo vislumbrar
o teu abanar de cabeça, o contrair de corpo. Previsível, nesse teatro tão teu.
A etiqueta exige que pergunte por ti. Essa linha, eu deixo
a crepitar na tua lareira ou no caixote mais perto. Meu ou teu. O que quiseres.
Não te procuro encontrar. Não quero saber se estás bem. Se
um novo amor floresceu. Tão-pouco, se ainda choras por mim. Porque haverias de fazê-lo?
Partiste. Sem olhar para trás. Nem isso eu sei. Olhaste
para o que ficou? Ou seguiste o teu caminho. Um novo – e sem mim. Fui o que
necessitaste no momento, com a aparência que quiseste que tivesse. Despeito?
Mete-me os defeitos que bem te aprazer. Porque haveria agora de ser diferente.
Vi a tua mãe no outro dia. Sem abraços calorosos. Sem
sorrisos. Um desvio de olhar, um baixar de cabeça e seguiu. E este foi o teu
legado.
Sim, afinal sei por onde é que quero começar. Tu
traíste-me. Sim, foste tu. Passaste a borracha e estavas pronta para continuar.
Necessito de amadurecer tudo o que aconteceu. Dá-me uns dias... Dei-te um beijo
e fui trabalhar. Voltei e já não estavas. Não deixaste um creme, escova de
dentes ou a minha t-shirt que usavas às vezes para dormir. Ainda a usas? Ou
levaste por ter mais o teu cheiro do que o meu?
Em pensamento imagino-te a procurares-me. A quereres
saber se encontrei um novo amor. Sou o teu porto seguro, dizes-me em sussurro ao
ouvido. Queres-me. A generosidade da ilusão, desmente-me.
E sabes o que mais me dói? O amargo sabor da inércia. Se
ao menos eu tivesse escrito uma carta que fosse. Mesmo esta.
Mas a carta não seguiu. O selo foi colocado, bem como a
tua nova morada. A caneta tremeu. Escrevi o teu nome com a minha melhor letra. Baixei
os braços e deixei-me ir. Deixei-te ir,
sabendo que a chama não existe sem combustível e oxigénio. Eu não sou o teu
respirar. Não sou. Não fui. E, porventura não terei sido.
Já quase ninguém escreve cartas, infelizmente. Vai tudo por mail e nenhum fica por enviar...
ResponderEliminarPior ainda são as cartas, que não são cartas, por mensagens de telemóvel.
Boa semana.
Um abraço.